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VÍCIO NA CONSTITUIÇÃO DO AUTO DE INFRAÇÃO Destaque

Consequências do erro na capitulação legal da penalidade

07 Ago 2019 0 comment
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Ensina o artigo 10, inciso IV do Decreto nº 70.235/72, que dentre os requisitos de constituição do auto de infração deverá ser indicada a disposição legal supostamente infringida pelo Contribuinte, assim como a respectiva penalidade aplicável e correspondente indicação da base legal para aplicação da pena.

Sobre este tópico e alcance do referido dispositivo, o acórdão que hoje trazemos em destaque trata de análise feita pela Câmara Superior de Recursos Fiscais – CSRF, que, por maioria de votos, decidiu por negar provimento ao Recurso Especial interposto pela Fazenda Nacional e, assim, anular parcialmente o auto de infração em função do erro na capitulação legal da multa administrativa incidente sobre a prática de subfaturamento nas importações. (Acórdão nº 9303-006.206).

O caso em questão derivou de fiscalização aduaneira que identificou a prática de subfaturamento em importações, gerando redução indevida dos valores devidos a título de Imposto de Importação – II, IPI, PIS-Importação e COFINS-Importação.

De acordo com o apurado pela Fiscalização, o Contribuinte autuado teria manipulado o valor das faturas consideradas para apuração do valor aduaneiro considerado para verificação dos valores dos tributos aduaneiros. Tal manipulação se dava mediante a omissão da parcela paga pelo importador a título de “adiantamento para o início da produção, também denominado de downpayment, prepayment ou advance”, de modo que o único valor informado nas declarações de importação correspondia ao valor remanescente dos valores relativos às mercadorias importadas.

Considerando as provas documentais juntadas pela Fiscalização, dúvidas não restaram sobre a prática fraudulenta incorrida pelo Contribuinte e seus representantes legais, razão pela qual lavrado foi o auto de infração para cobrança das diferenças tributárias, acrescida de multa de ofício qualificada e, ainda, responsabilização solidária dos sócios-gerentes da empresa autuada.

Nos termos do relatório fiscal, além da exigência em relação aos tributos, foi aplicada a multa por conversão da pena de perdimento em valor equivalente ao valor aduaneiro da mercadoria, nos exatos termos dos arts. 23, inciso IV do Decreto-Lei nº 1.455/76 e 105, XI, do Decreto-Lei nº 37/66, que assim dispõem:

Art 23. Consideram-se dano ao Erário as infrações relativas às mercadorias:
(…)
IV – enquadradas nas hipóteses previstas nas alíneas ” a ” e ” b ” do parágrafo único do artigo 104 e nos incisos I a XIX do artigo 105, do Decreto-lei número 37, de 18 de novembro de 1966.

Art.105 – Aplica-se a pena de perda da mercadoria:
(…)
XI – estrangeira, já desembaraçada e cujos tributos aduaneiros tenham sido pagos apenas em parte, mediante artifício doloso;

Ocorre que, não obstante a previsão de aplicação da penalidade do arbitramento ou multa equivalente em percentual de cem por cento do valor aduaneiro nos termos acima colocados, olvidou-se a Fiscalização da regra específica prevista no art. 88, parágrafo único da Medida Provisória nº 2.158-35/2001, a qual estabelece a incidência de multa administrativa em percentual de também cem por cento, mas tendo como base de cálculo não o valor aduaneiro da mercadoria, mas sim a diferença entre o preço declarado e o preço efetivamente praticado na importação.

Ou seja, de um lado a Fiscalização entendeu a aplicável a multa administrativa equivalente a cem por cento da mercadoria, em substituição à pena de perdimento, por entender que se estaria diante de uma redução de tributos aduaneiros mediante artifício doloso, enquanto de outro lado o Contribuinte sustentou que a penalidade aplicável deveria considerar o fato típico do subfaturamento, o qual indica que a multa administrativa, embora também no percentual de cem por cento, teria como base de cálculo diversa.

Seguindo as disposições de tal previsão legal, alegou o Contribuinte a nulidade de tal imposição por erro na capitulação legal do auto de infração quanto à aplicação da multa administrativa, argumento este que foi acolhido já quando da análise da impugnação realizada pela Delegacia Regional de Julgamento, entendimento este reafirmado pelo CARF e, finalmente, pela CSRF.

O raciocínio acolhido para afastamento da penalidade prevista nos arts. 23, inciso IV do Decreto-Lei nº 1.455/76 e 105, XI, do Decreto-Lei nº 37/66, considerou os Princípios da Sucessividade e Especialidade a fim de resolver o conflito de normas, nos seguintes termos do voto vencedor:

“Para solução da controvérsia sobre qual das normas seria aplicável ao caso concreto, recorro-me ao Princípio da Sucessividade e ao Princípio da Especialidade; o primeiro define que quando duas ou mais normas sucedem no tempo, referindo-se ao mesmo fato a que for posterior sempre será preferida; o segundo afirma que a norma será considerada especial quando trouxer elementos próprios e particulares à descrição da norma geral e, por isso mesmo, deverá prevalecer”.

Seguindo tal raciocínio, a Conselheira-Relatora consignou que a partir de 24 de agosto de 2001, com inserção do art. 88 da MP nº 2.158-35/2001, passou a ser prevista “penalidade específica a ser aplicada na hipótese de subfaturamento”, tendo tal ilícito sido “excluído do rol das fraudes enumeradas em qualquer dos incisos do art. 23 do Decreto-Lei nº 1.455/76″, de modo que aplicável ao caso seria apenas a multa administrativa sobre a diferença entre o valor declarado e o valor efetivamente praticado na importação (art. 88, parágrafo único da MP 2.158-35/2001), em contraponto àquela consignada na autuação.

Com efeito, atentamente foi observado pela Relatora que embora os fatos descritos na autuação pudessem ser caracterizados como exemplos de “declarações falsas”, o que levaria à imposição da penalidade prevista no art. 23 do Decreto-Lei nº 1.455/76, o “fato central da descrito na autuação” seria o subfaturamento, sendo a declaração falso mero “meio para tal prática”. Ou seja, entendeu a julgadora que a penalidade a ser considerada é aquela aplicável ao fato ilícito, mas não àquelas eventualmente aplicáveis aos fatos que foram empreendidos para alcançar o ilícito identificado.

Ainda, bem lembrou a Conselheira-Relatora da regra disposta no art. 703 do Regulamento Aduaneiro, a qual estabelece que “na hipótese de o preço declarado for diferente do arbitrado na importação aplica-se a penalidade específica”, o que reforça ainda mais a incidência da regra colocada no art. 88, parágrafo único da MP 2.158-35/2001, em relação aos fatos que levaram à autuação.

Assim, de maneira adequada no nosso entender, acertada foi a decisão proferida pela turma da CSRF a fim de cancelar a multa administrativa imposta pela Fiscalização no caso ora apresentado, tendo em vista o evidente vício material na capitulação legal da penalidade aplicável e, consequentemente, violação ao disposto no art. 10, IV do Decreto nº 70.235/72.

Escrito por: Thales Stucky – Advogado, LL.M. em Tributação Internacional pela New York University e Ex-presidente do Instituto de Estudos Tributários – IET. Sócio de Trench, Rossi e Watanabe Advogados
Fonte: Jota

COMENTÁRIO DE OMAR AUGUSTO LEITE MELO: no âmbito da tributação municipal, além da nulidade da autuação por erro de tipificação da multa aplicada, a Administração Tributária Municipal também precisa se atentar para não incorrer em nulidade por erro na classificação (tipificação) do serviço tributável pelo ISS, enquadrando adequadamente o serviço tributável em um subitem da lista. Por exemplo, temos percebido algumas nulidades na autuação do ISS sobre serviços bancários, quando o agente fiscal municipal não cita o subitem da lista ou faz incorretamente o enquadramento. Tal como ocorreu nesta decisão do CARF, entendo que esse erro não é sanável durante o processo administrativo, ocasionando a extinção do crédito tributário defeituosamente lançado.

Última modificação em Domingo, 24 Maio 2020 14:40

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