“A decisão de primeira instância, se não é inédita, é extremamente incomum”, afirma Paulo Sigaud, do Aidar SBZ Advogados e responsável pela causa.
A ação foi proposta após a prefeitura lavrar autos de infração contra a empresa pleiteando a cobrança do IPTU com base na progressividade em relação aos exercícios de 2007 e 2008. A companhia, alegando a inconstitucionalidade da alíquota progressiva, pedia a anulação naquilo que superaram a alíquota mínima prevista na legislação, de 1,5%.
Na ação, pediu ainda o reconhecimento do direito a compensar os valores pagos a mais com os valores vincendos do IPTU. Alternativamente, requereu a restituição pura e simples de tais valores, devidamente atualizados. O município, em sua defesa, argumentou que não há possibilidade de compensação, pois o crédito não tem liquidez e certeza.
A Constituição Federal de 1988 previa como única possibilidade de cobrança progressiva de IPTU o não cumprimento da função social da propriedade. No entanto, a Emenda Constitucional 29, de 2000, alterou o artigo 156 e passou a permitir que o IPTU seja progressivo em razão do valor do imóvel e tenha alíquotas diferentes de acordo com a localização e o uso do imóvel. E a lei municipal autorizadora da cobrança do IPTU com alíquotas progressivas é anterior à emenda 29.
O próprio Supremo Tribunal Federal (STF), comandado pelo ministro Cezar Peluso, tem uma súmula que diz ser “inconstitucional a lei municipal que tenha estabelecido, antes da Emenda Constitucional 29/2000, alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana”. A norma foi levada em conta na decisão.
“Na hipótese, não há lei específica para área incluída no Plano Diretor Municipal a justificar a instituição do tributo progressivo. Não há como falar-se, ainda, em imposto de caráter pessoal, no caso do IPTU, que, por sua natureza, tem caráter real. Registre-se que não se trata de seletividade, já que esta pressupõe a diferenciação de alíquotas em razão da diversidade do objeto tributado”, diz a decisão. “Se a menor alíquota prevista para terrenos corresponde a 1,5%, é de rigor sua incidência a todos os terrenos, independentemente da localização.”
A decisão registrou ainda que a compensação não é inviável, pois “o valor pago indevidamente pode ser definido através de meros cálculos aritméticos”. Segundo o advogado, para combater a inexistência de previsão legal no âmbito municipal, o escritório sustentou que mesmo com tal lacuna, a previsão contida no artigo 170 do Código Tributário Nacional, que autoriza a compensação de créditos tributários nos termos da lei, teria eficácia plena. “Não havia lei ordinária local que disciplinasse a compensação, como ocorre em muitos municípios. No caso, o juiz considerou que já há uma previsão geral e o contribuinte não pode ficar a mercê da falta de norma específica”, afirma Paulo Sigaud.
Para ele, a decisão incomum pode abrir precedentes, inclusive nos casos de restituição de Imposto sobre Serviços (ISS). Sigaud afirma que a tese inovadora é a de que o contribuinte não precisa esperar a edição de leis específicas se já existe previsão no Código Tributário. Ainda cabe recurso da decisão. “A Justiça é dividida, mas a discussão é longa e deve chegar aos tribunais superiores”, diz.
DCI – SP - Andréia Henriques
COMENTÁRIO DE OMAR AUGUSTO LEITE MELO: realmente, a grande inovação dessa decisão está no fato de autorizar a compensação do indébito tributário sem respaldo em lei municipal que autoriza a compensação. O art. 170 do CTN faculta aos Fiscos a edição de lei específica tratando do instituto da compensação. Particularmente, acredito que essa decisão será derrubada no TJSP ou no STJ, na medida em que o artigo 170 delega expressamente a uma lei específica (no caso, municipal) a faculdade (não imposição) de se prever a compensação tributária.