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STF E A SUA APRECIAÇÃO RELATIVA À DEDUÇÃO, OU NÃO, DOS MATERIAIS NA BASE DO ISS SOBRE A CONSTRUÇÃO CIVIL

31 Ago 2010 0 comment
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  Omar Augsto Leite Melo
Omar Augusto Leite Melo

Um dos julgados da nossa Suprema Corte mais aguardados neste ano no campo se refere ao tema da composição da base de cálculo do ISS incidente na construção civil, mais especificamente com relação à dedução, ou não, dos materiais fornecidos pelo prestador (adquiridos em lojas especializadas ou diretamente da indústria).

Esse assunto já está, há muito tempo, definido no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, tanto à luz do Decreto-lei nº 406/68 (até 2003), como, também, da Lei Complementar nº 116/2003 (a partir de 2004), em sentido favorável aos Municípios, ou seja, contra a dedução desses materiais.

Com efeito, o STJ interpretou o artigo 7º, §2º, inciso I, da LC 116/2003 conjuntamente com os subitens da lista anexa que versam sobre os serviços relacionados à construção civil (7.02 e 7.05).

No artigo 7º, §2º, inciso I, consta a “não inclusão” dos “materiais fornecidos” pelo prestador dos serviços previstos nos referidos subitens, dando uma ideia preliminar que se trata de “qualquer material fornecido”. Por outro lado, nesses dois subitens da Lista anexa à LC 116/2003 consta apenas a exceção ao ISS do fornecimento de “mercadorias produzidas” pelo prestador de serviços, e essa produção (leia-se “industrialização”, produção em larga escala, não personalizada, não feita sob encomenda) ainda deve ocorre fora do local da prestação dos serviços. Em tais casos (exceções), o imposto devido passa a ser o ICMS, e não o ISS.

Aí vem a “divergência”: “materiais fornecidos” (artigo 7º, §2º, I) é um conceito mais amplo do que “mercadorias produzidas” (subitens 7.02 e 7.05). O STJ, então, interpretou esses dispositivos de forma sistemática e combinada: ao excluir os “materiais fornecidos” da base de cálculo do ISS, o artigo 7º, §2º, inciso I, quis se referir, na verdade, à “mercadorias produzidas pelo prestador fora do local da prestação de serviços”, conforme especificado nos subitens 7.02 e 7.05.

Realmente, essa interpretação do STJ está adequada e coerente com o artigo 1º, §2º, da própria LC 116/2003, segundo o qual incidirá sempre o ISS sobre “toda” a operação (serviços + materiais utilizados como insumos), quando a lei complementar prever (definir, declarar) o serviço como sujeito ao ISS, afastando-se a incidência do ICMS. Agora, este dispositivo começa ressaltando que “ressalvadas as exceções previstas na lista anexa”, o ICMS poderá incidir sobre o fornecimento de mercadorias, quando, então, o ISS é quem ficará de fora. Importante frisar que o artigo 1º, §2º, da LC 116/2003, bem como essas ressalvas em prol do ICMS possuem amparo constitucional no artigo 155, §2º, IX, “b”, da Constituição Federal.

Mas, o assunto foi parar no Supremo Tribunal Federal, ganhando o status de repercussão geral nos RE nº 579.431, nº 580.108 e nº 582.650, todos sob a relatoria da Ministra Ellen Gracie.

A propósito, cumpre transcrever, abaixo, a íntegra dessa decisão monocrática da Ministra, na medida em que esclarece o alcance dessa discussão que vai ao Plenário do STF:

“1. Trata-se de recurso extraordinário, fundamentado na alínea a, interposto contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça, cuja ementa é a seguinte:

TRIBUTÁRIO – ISS – CONSTRUÇÃO CIVIL – BASE DE CÁLCULO – MATERIAL EMPREGADO – DEDUÇÃO – IMPOSSIBILIDADE.

A jurisprudência desta Corte pacificou o entendimento de que a base de cálculo do ISS é o preço total do serviço, de maneira que, na hipótese de construção civil, não pode haver a subtração do material empregado para efeito de definição da base de cálculo. Precedentes de Corte.

Agravo regimental improvido. 

2. A recorrente sustenta que o
Decreto-Lei 406/68, o qual regulava a matéria à época dos fatos geradores, em seu artigo 9º, § 2º, letra a, autorizava a dedução, e que tal dispositivo foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, conforme jurisprudência desta Corte.


Também alega que o acórdão recorrido, ao entender não ser cabível a dedução na base de cálculo do ISS dos materiais fornecidos pela recorrente em seus serviços de concretagem de obras de construção civil, teria violado os
arts. 59 e 146, III, a, da Constituição Federal.


3. Observados os demais requisitos de admissibilidade do presente recurso extraordinário, passo à análise da existência de repercussão geral.


A verificação da constitucionalidade da incidência do ISS sobre materiais empregados na construção civil, questão versada no presente apelo extremo, possui relevância do ponto de vista econômico, político, social e jurídico, nos termos do § 1º do art. 543-A do Código de Processo Civil.


É que o assunto, de natureza eminentemente tributária, alcança, certamente, grande número de contribuintes no País. Além disso, embora se trate de imposto municipal, é possível a repetição dessa mesma questão nas demais unidades da Federação, sendo necessária a manifestação desta Corte para a pacificação da matéria.


Ressalte-se que, com o reconhecimento da existência da repercussão geral da matéria, deve ser aplicado o regime legal previsto no art. 543-B do Código de Processo Civil, conforme procedimento já apreciado por  esta Corte no julgamento das Questões de Ordem no RE 579.431, no RE 580.108 e no RE 582.650, todos de minha relatoria.


Ademais, verifico que
a matéria já se encontra pacificada no âmbito desta Corte, no sentido da possibilidade da dedução da base de cálculo do ISS dos materiais empregados na construção civil. Cito os seguintes julgados: RE 262.598, red. para o acórdão Min. Cármen Lúcia, 1ª Turma, DJe 27.09.2007; RE 362.666-AgR, rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, DJe 27.03.2008; RE 239.360-AgR, rel. Min. Eros Grau, 2ª Turma, DJe 31.07.2008; RE 438.166-AgR, rel. Min. Carlos Britto, 1ª Turma, DJ 28.04.2006; AI 619.095-AgR, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, DJ 17.08.2007; RE 214.414-AgR, rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma, DJ 29.11.2002; AI 675.163, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 06.09.2007; RE 575.684, rel. Min. Cezar Peluso, DJe 15.09.2009; AI 720.338, rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 25.02.2009; RE 602.618, rel. Min. Celso de Mello, DJe 15.09.2009.


Desse modo, entendo que, com o reconhecimento da existência da repercussão geral e havendo entendimento consolidado da matéria, os Tribunais de origem e as Turmas Recursais podem, desde logo, com fundamento no § 3º do citado art. 543-B, aplicar a orientação firmada por este Supremo Tribunal Federal.


Assim, nos termos do art. 325, caput, do RISTF, o relator poderá julgar o recurso extraordinário monocraticamente.


4. Ante o exposto, manifesto-me pela existência de repercussão geral da matéria discutida no presente recurso extraordinário, a fim de que sejam observadas as disposições do art. 543-B do Código de Processo Civil”
(os destaques são nossos).

Portanto, percebe-se que o assunto a ser enfrentado, pelo menos nesses três processos (e outros decorrentes com o mesmo objeto), não entra na Lei Complementar nº 116/2003, é dizer, alcança apenas as situações regidas pelo Decreto-lei nº 406/68 (vigente até 2003, relativamente a esse assunto). A propósito, estão em “xeque” apenas os artigos 59 e 146, III, “a”, da Constituição Federal, que tratam tão-somente da formalidade do processo legislativo, ou melhor, que mexem com a competência da lei complementar em matéria tributária.

Por outro lado, nos precedentes do STF citados pela Ministra Ellen Grancie apenas foi decidido que o (revogado) artigo 9º, §2º, do DL 406/68 foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, afastando a tese das Municipalidades de que ele trazia uma isenção heterônoma, vedada pelo artigo 151, III, da CF/88. Em outras palavras, o STF, naqueles casos, definiu que o mencionado artigo do DL 406/68 apenas definiu a base de cálculo do ISS, sem qualquer violação à competência tributária dos Municípios, sem criar uma isenção. Ora, isso também ocorreu da mesma maneira quando a Suprema Corte tratou do chamado “ISS-fixo”, inclusive sumulando o assunto em favor dos contribuintes (Súmula 663 do STF).

Dessa forma, esse julgamento do STF não trará repercussão para os fatos geradores ocorridos sob a égide da LC 116/2003, não vai interferir no posicionamento sacramentado pelo STJ contra a dedução desses materiais na base imponível do ISS. Aliás, o STF nem vai entrar em outros assuntos que não sejam a recepção, ou não, daquele artigo 9º, §2º, do DL 406/68, revogado pela LC 116/2003 (revogação esta que se deu de forma tácita, na medida em que essa nova lei regulamentou por inteiro o assunto tratado pela legislação pretérita em seu artigo 7º, §2º c/c artigo 1º, §2º).

Enfim, não está em jogo, pelo menos nesses três processo arrolados pela Ministra Ellen Gracie, se a inclusão dos materiais na base de cálculo do ISS fere a capacidade contributiva, viola a competência tributária dos Estados (ICMS), ou desnatura o fato gerador do imposto municipal (prestação de serviços). O assunto, então, já é “velho” conhecido e, realmente, com entendimento pacificado no STF em prol da dedução dos materiais na base de cálculo do ISS sob a égide do (revogado a partir de 2004) artigo 9º, §2º, do Decreto-lei nº 406/68.

Última modificação em Quarta, 15 Março 2017 03:20

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